Fachadas

Facies

Sobre a fachada em arquitetura 


Alberto Campo Baeza (1)

Palladio, Basilica Palladiana, Vicenza
Sobre a minha mesa está um velho dicionário etimológico latino-espanhol. No verbete facies, além de mencionar: cara, rosto, semblante (faccia, viso, volto), faz referência ao termo em diferentes autores clássicos como Plínio, Virgílio, Terêncio e muitos mais. Ovídio usa facies como formosura e uma frase dele é citada: “cura dabit faciem, facies neglecta peribit”, “o cuidado dará formosura, a formosura descuidada perecerá”. Parece um preceito dirigido aos arquitetos de hoje, pois os de ontem bem que cuidavam de fazer bem a facies, a fachada.

Os arquitetos de hoje se preocupam com a fachada? Me parece que não, porque com base na pretensa liberdade que lhes oferece a tecnologia, que torna tudo possível, erguem fachadas impossíveis, que mais que fruto da razão são consequência da arbitrariedade e do capricho.

Ao longo da história a fachada sempre foi uma parede onde estrutura e composição se encontravam. Agora os arquitetos desarmaram o brinquedo e colocaram as peças de um modo que ele já não funciona. A estrutura foi separada da fachada, que se converteu em uma pele que se toma por livre. Outros puseram os ossos, a estrutura, na fachada para demonstrar essa liberdade. E, logo em seguida, proclamaram que aquilo, sua composição caprichosa, é uma obra de arte. Pensem um pouco e não se lembrarão de nenhum desenho de fachada de nenhum dos monstros que se tem construído recentemente.

Nas páginas dos tratados clássicos havia mais desenhos de fachadas que de plantas. O de Vignola mostra 47 desenhos de fachadas, apenas fachadas. E nas 207 ilustrações no livro de Palladio há muito mais fachadas que plantas. Do Pantheon aparece apenas uma planta e nove desenhos de fachadas interiores e exteriores.

Se pensamos nos arquitetos contemporâneos, imediatamente vêm à nossa memória, e ao Google Images, as imagens de suas fachadas. Se Mies é a Farnsworth, vista de fora, Le Corbusier é Ronchamp, vista também de fora. E Renzo Piano segue sendo a fachada do Pompidou. E Ponti a Pirelli, e Gehry o Guggenheim, vistos sempre de fora. Sim, já sei que você e eu pensamos também no interior.


O maior elogio que alguém fez das minhas obras é que o que se lembrava delas eram os cortes, os espaços interiores. Desde a casa Gaspar à casa Guerrero, desde os escritórios de Zamora à Caja de Granada. Mas lhes juro que sempre tenho cuidado e seguirei cuidando também das minhas fachadas. Como bem manda Ovídio para tentar atingir a beleza.

(1) Publicado em Varia Architectonica, Mairea Libros: Madrid, 2016

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