O QUE SCHINKEL FEZ QUANDO TEVE QUE EXPLICAR COMO SE APRENDE ARQUITETURA

Por Santiago de Molina, publicado em Múltiples estratégias de proyecto, em 3/10/2016.
Karl Friederich Schinkel, Bauakademie . Berlin, 1831-36. Fonte desconhecida.

Diz a lenda que Karl Friederich Schinkel deu início a sua vocação artística ao visitar uma exposição e ficar impressionado com uma das obras ali penduradas. E também é lenda que renunciou a sua vocação de pintor ao passear entre os quadros de outra exposição poucos anos depois (1). Desde então pouca gente voltou a ter a sorte de receber a inspiração das musas nesses lugares, (em geral mais cheios de gente que de obras). Berlin, Mies e a Arquitetura lhe devem, pelo menos, gratidão.

Schinkel praticou arquitetura como um típico arquiteto do século dezenove, mas foi especialmente talentoso e teve a rara capacidade de prescindir de tudo o que era supérfluo, da decoração e das artes aplicadas. Curiosamente, e apesar de que a sua vocação havia sido despertada como uma conversão repentina, o certo é que teve ocasião de construir um lugar onde os arquitetos puderam aprender um ofício tão incerto sem recorrer às musas nem a eventos paranormais: construiu uma escola de Arquitetura em 1831.

Sem entrar em pormenores do velho ensino que era ministrado entre as paredes da Bauakademie, pode-se dizer que o resultado foi um edifício que falava do futuro da modernidade: desde sua inesperada austeridade à sua estrutura de pórticos de aço, a obra sugeria uma janela para o futuro sobre a qual Mies van der Rohe soube se debruçar.

Qualquer um diria que a contenção formal da sua planta poderia facilmente encarnar o próprio espírito da arquitetura. Tudo ali era rígido, reticulado com um ritmo incessante de 5,5m. Nem um descanso. Aparentemente.

Num canto do edifício, apenas um detalhe de toda a planta, existe uma pequena passagem diagonal. Diminuta, quase negligenciável. Uma porta oblíqua, medieval, frente à racionalidade da retícula, para resolver o problema de entrar numa sala de esquina desde o corredor central de circulação. Um lugar inspirado. Necessário. Uma diagonal pequeníssima, um acento que parece dizer a qualquer dos alunos que lá estudaram: a arquitetura é ofício, medida e ritmo, mas também um talento especial que sabe identificar oportunidades que estão além da lógica convencional para introduzir a excepcionalidade. Ou, dito de outro modo, o indicativo de um olhar especial, próprio do arquiteto. O edifício já não existe, após a guerra e as sucessivas tentativas de reconstrução e destruição, não se conseguiu reergue-lo, a não ser por um canto e uma estrutura de andaimes coberta por lonas que reproduzem as suas fachadas. E, claro, sem aquela diagonal tão negligenciável como significativa.

Tradução: Edson Mahfuz.

(1) As duas obras foram um croquis do arquiteto Friedrich Gilly para um monumento a Frederico o Grande e o quadro Monge no mar, de Caspar David Friedrich. Schinkel disse a si mesmo, num arroubo de autoconsciência, que nunca chegaria a pintar melhor que esse quadro de Friedrich. E deixou a pintura para dedicar-se à construção.

Karl Friederich Schinkel, Bauakademie . Berlin, 1831-36. Fonte: Jean-François Bédard
Karl Friederich Schinkel, Bauakademie . Berlin, 1831-36. Fonte desconhecida.



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